Bem-aventurados os que choram, porque serão consolados”.
Mateus 5:4
Continuando a série sobre as bem-aventuranças, chegamos à segunda beatitude proferida por Jesus no Sermão da Montanha. Essa é, certamente, umas das bem-aventuranças que mais chocam os ouvidos menos espirituais.
Jesus está dizendo que felizes são as pessoas que choram. Parece um total contrassenso. Que segredo da felicidade é esse? Como chorar pode nos fazer felizes?
Bem, temos sido um pouco repetitivos em falar que o Reino dos céus tem uma lógica própria. E essa lógica desafia a lógica terrena.
Estamos acostumados a associar pessoas felizes a pessoas com um sorriso largo e radiante no rosto que estão sempre se divertindo. Mas não é esse o conceito celestial para a busca da felicidade.
Não estou dizendo, de forma alguma, que um discípulo de Cristo não seja alguém alegre e sorridente. Nós devemos sim andar sorrindo, pois o nosso sorriso é verdadeiro e reflete a verdadeira alegria que existe dentro de nós: a alegria de servir a Deus e de ser amado por Ele.
Não acho que o crente deve ter cara fechada e ser ranzinza.
Entretanto, devemos entender que a felicidade desse mundo é falsa e, quando existe, se resume à alegrias passageiras.
Mas a felicidade que Jesus promete é bem-diferente:
- É uma alegria eterna
- É uma alegria que está conosco em todo o tempo
- É uma alegria verdadeira
Essa alegria só é alcançada através de uma vida que agrade a Deus. Fomos criados para agradar a Deus. Esse é o nosso propósito, nossa razão de ser. Não encontraremos nenhuma felicidade ou alegria verdadeira fora disso. Nada pode suprir a falta da Presença divina em nossa vida.
Mas o que isso tem a ver com chorar?
Em primeiro lugar, precisamos entender que essa felicidade não depende apenas de chorar. Se fosse assim, praticamente todas as pessoas seriam felizes, bem-aventuradas, pois quase todo mundo já chorou por alguma coisa nessa vida.
É claro que Deus se importa com todas as pessoas que choram e sofrem. Mas não é sobre todo o tipo de choro e sofrimento que recai esta bem-aventurança. Até porque, como disse antes, todo mundo sofre e chora de algum modo.
As pessoas choram por muitas coisas. Mas o choro a que Jesus se refere é um choro diferente. É um choro:
- de arrependimento
- de anelo pela Presença de Deus
- de reconhecimento de nossa condição de dependência
- de súplica diante de Deus
Enfim, é um choro espiritual. E existem várias formas de chorar de forma espiritual. Podemos chorar para outras pessoas conheçam Deus; por problemas espirituais da nossa igreja ou da nossa nação; podemos chorar até pelos nossos próprios problemas, desde que seja diante do Senhor esse choro.
Mas eu creio que o sentido mais forte e importante desse choro citado por Jesus é exatamente o de arrependimento. Ora, se a felicidade está em agradar a Deus e se relacionar com Ele, é indispensável o arrependimento. Não podemos nos achegar a Deus sem um coração arrependido e contrito (Salmo 51.17).
A mensagem principal de Jesus era de salvação e arrependimento. Isso não é só sofrer pelo pecado. Veja que, mais cedo ou mais tarde, as pessoas vão chorar por terem feito coisas que desagradam a Deus.
Entretanto, muitas delas só vão fazer isso pela consequência que estão sofrendo naquele momento. Foi o caso de Judas. Ele com certeza chorou após ter traído Jesus por 30 moedas de prata. Seu desespero foi muito grande (Mateus 27.3-5). Mas isso não foi suficiente.
Judas (o Iscariotes) é o exemplo mais famoso de remorso. É um choro pelo pecado, mas não é arrependimento. Arrependimento é metanoia. É mudança de rumo, mudança de atitude. É se esforçar para estar no centro da vontade de Deus.
É nesse sentido que são bem-aventurados os que choram. Eles serão consolados. Consolados porque alcançarão a graça e o perdão de Deus.
Se a bem-aventurança anterior falava de um primeiro passo para se achegar a Deus, que é reconhecer sua total necessidade e dependência Dele, essa já revela um segundo estágio na vida cristã: o arrependimento.
Se é impossível servir a Deus e se achegar a Ele sem reconhecer nossa própria pobreza, também é igualmente impossível sem se arrepender.
É quase impossível falar em arrependimento pelo pecado sem falar do exemplo de Davi. Ele cometeu um dos pecados mais horríveis imagináveis. Seus pecados foram, de certa forma, mais graves até do que os de Saul, o rei rejeitado por Deus.
Mas a diferença entre eles é que Davi se arrependeu, enquanto Saul teve apenas remorso. Saul tinha medo de perder o reino, Davi tinha medo de perder a presença. Saul procurava alguém para culpar, Davi assumia seus erros e as consequências deles.
O resultado é que Deus se agradou de Davi e não só o perdoou, como o promoveu a um status jamais dado a outro ser humano: o de homem segundo o coração de Deus.
Já podemos descrever alguns aprendizados importantes sobre arrependimento:
- Arrependimento envolve reconhecer o erro
- Arrependimento envolve confessar o erro
- Arrependimento envolve sofrer (chorar) pelo erro
- Arrependimento envolve desejo de deixar o erro
- Arrependimento envolve mudança de atitude
Essa é mais uma das virtudes que Deus espera de nós. Um coração arrependido. E Ele nos oferece seu próprio consolo como promessa e garantia.
Esse consolo, além do seu gracioso perdão, envolve muitas outras coisas. A começar pela vida eterna que está preparada para nós.
Mas esse consolo não está só na eternidade. É claro que essa é a nossa maior esperança: um dia no qual não haverá mais choro, pois o Cordeiro enxugará dos nossos olhos toda lágrima (Apocalipse 21.4).
Mas este consolo está disponível para nós todos os dias. Jesus levou tão à sério essa promessa de consolo que Ele nos enviou um Consolador por excelência: o próprio Espírito Santo (João 14.16). Ele está conosco todos os dias a nos consolar.
Chorar diante das pessoas pode até ter algum benefício emocional, mas elas muitas vezes não poderão te consolar. Mas existe algo muito melhor.
Derrame a sua alma diante de Deus; busque-o com um coração arrependido e sincero; e alegre-se com a certeza de que o Espírito Santo está vendo o seu choro e pode te consolar.